Friday, July 22, 2011

Cíclades


Cíclades

Cíclades... ciclos... são assim... abrem e fecham. Abri uma nova temporada quando marchei para o mar. E o mar se abriu pra mim. Fui para o mundo. Quando um lugar se torna estreito é preciso seguir - sair do acampamento, diz Borner, em A Alma Imoral, que acabei de ler há poucos dias. Guiada por minha alma que dizia o que era bom, e não o que era correto, saí. O movimento é bom. E o melhor é que quando a gente segue a alma o caminho se torna o correto. E agora o ciclo está se fechando, mas sem se antecipar pois ainda tenho cada um desses últimos dias para desfrutar.

Templo de Zeus, Athenas, Grécia
De Roma fomos para Atenas aonde esperamos minha mãe chegar do Brasil. Então formamos o quarteto para o início dessa temporada na Grécia. Athenas confirma o meu desgosto por centros urbanos. Mas maravilha por sua Acropoli. No alto da montanha se vê de qualquer ponto da cidade as ruínas de mármore branco do império Grego, em contraste com o céu azul ensolarado de pleno verão. Ou à noite com os holofotes que mantém a principal decoração da cidade a vista de todos a toda hora.
Mas o destino na Grécia pra mim sempre foi o mar. As ilhas Gregas. E é de uma delas que lhes escrevo agora. Visitei vários mares nessa viagem: mar Adriático, mar da Ligúria, mar Tirreno e agora dei as boas vindas para os lindos mares azuis: mar Egeo e mar Mediterrâneo.
Acrópoli, Atenas, Grécia
Estou em Paros, uma das ilhas cíclades. Como diz meu pai em Paros parei! E paramos mesmo porque esse finalzinho sem programação nos deixou mais 2 dias aqui. Só tinha barco para o nosso próximo destino, Creta, dois dias depois do que queríamos. Sem nenhum incomodo, pois estender a estadia em uma dessas ilhas não é esforço algum. E há que se deixar levar quando se está viajando. Depois do passeio de barco que fizemos hoje, eu e minha irmã, é fácil entender porque ficamos mais uns dias aqui. Nadei na imensidão azul. E o efeito: uma leveza no corpo e na alma.
Atenas, Grécia
Leveza e alegria que contrastam a sensação de poucos dias atrás quando adoeci. Outra infecção, agora de garganta. Como se não bastasse os meses de sinusite e a cirurgia antes da minha viagem. E depois de 90 dias me sentindo cada dia melhor, respirando mais... outra! Fiquei mais triste que doente quando acordei baqueada. Pensei até em voltar mais cedo para o Brasil. Mas enfim, um suspiro e médico. Eu não queria sentir como é viver fora do Brasil? Então? Vamos resolver os problemas no local da morada. Fui ao hospital público de Paros e fui medicada. Dessa vez o antibiótico fez efeito rápido e eu diminuí o ritmo de sol para poder completar os meus 100 dias.
Paros é uma ilha pouco turística. Na verdade é um lugar de veraneio dos Gregos o que a torna muito especial. É calma e não tem os grupos com bandeirinhas para cá e para lá. Menos árida que as que visitamos anteriormente. Aqui se vê algum verde, arbustos e árvores retorcidas.



Aliás, esse é o retrato dessas ilhas: paisagens áridas, quase desérticas mas rodeadas pelo mar mais azul do mundo. Pelo menos dos que eu já vi. Casinhas brancas espalhadas em um amplo espaço com poucos detalhes em cor. A maioria puro branco. Só em Santorine que as construções se aglomeram aos montinhos brancos no topo das montanhas. E vermelho às 20:45 quando o sol mergulha no mar se espalhando por cima dessa paisagem simples e marcante.



Estou aqui na varanda do meu hotelzinho familiar contemplando essas casinhas brancas, esse mar e esse sol que acabou de dizer adeus mais ainda deixa seu rastro. Agradeço por tem tido tempo. Porque esse é o bem mais precioso da nossa era. Tempo para ver o por do sol a cada dia desse verão nas ilhas gregas. E curto esse ócio. Criativo. Aonde fora pouco acontece. Até o sol tem preguiça de ir embora e se recolhe tarde. E dentro muitos movimentos.

Antes de Paros estivemos o quarteto, pai, mãe, eu e irmã Rachel em Mikonos e Santorine. Mikonos abriu essa temporada em grande estilo aonde meu pai escolheu um hotel aonde o azul da piscina “encontrava”, com o azul do mar e com o azul do céu. Cada café da manhã era um evento regado a Prosseco. Demos gargalhadas quando uma menininha de uns 9 anos pergunta pra mãe, na mesa atrás da nossa, “Mãe, até quando vamos viver nessa vida de luxo?”. O inglês ainda deixou em nossos ouvidos a tradução como luxúria.

O que fez ainda mais sentido ao total desfrute que foi ficar naquele hotel todo branquinho, plataformas suspensas no meio da água da piscina para tomar sol, quartos com paredes levemente róseas, um clima romântico, bom até pra se apaixonar por si mesmo. Obrigada pai e mãe pela oportunidade. Tive dias maravilhosos. E ainda na companhia de vocês e da Rachel que mudou completamente o clima da viagem. Agora eram férias, com gente conhecida, confortável. Bom também!
Isso de mudar o clima é o mais saudável em uma viagem. E na vida, não é minha gente? Quem está dentro que sair, quem está fora quer entrar. Quando está quente queremos esfriar, quando está frio queremos esquentar. E essa foi a lógica que usei na minha viagem. Baseada no meu ritmo e alternando contrastes. Já tinha percebido isso em viagens anteriores e estou me aprimorando.
Santorine, fotógrafa Rachel Joffily
Na prática é assim: tinha visto muitas cidades, Istambul, Colonia, Praga e Veneza. Precisava refrescar os olhos, o corpo e o coração. Então antes de ir para Florença senti que precisa abrir espaço para esta cidade. Aliás, ela merece. Queria algo completamente diferente. Senão satura os sentidos e não absorvemos mais nada. Então fui para beira do mar, natureza, trilhas. E fiquei nesse clima por um tempo até descansar continuei no ecoturismo no norte da Itália até que estava pronta para receber Siena e Florença. Ou ser recebida? Ou ambos. A cidade nos recebe abrindo espaço pra gente entrar e nós a recebemos tendo espaço para deixá-la entrar. A alternância de contrastes também se fez presente no estar só e estar com. Passava uns dias sozinha, gostando de estar viajando comigo mesma, e quando já estava “saturando”, me juntada com uns aqui ou visitava um primo ali. E no final quando já estava dois meses longe da família recebo os com muita vontade. Esse é uma boa receita para motivação, não acham?! Alternância de contrates. Dá mais gosto em tudo. No calor. No frio.
Voltando a Santorine, foi um impacto já na chegada! Uma ilha comprida de um relevo recortado que conta a história de um vulcão que entrou em erupção e afundou Atlântida (dizem). Mas o fato é que uma grande porção de terra dessa ilha que era arredondada foi para o fundo do mar. E hoje formou o que eles chamam de caldeira. Local também aonde o sol debruça seu vermelho fogo pra não deixar esquecer a origem.
Fiquei boquiaberta. O barco ia se aproximando da ilha e aos poucos podíamos ver as casinhas brancas lá no alto da montanha. A maior parte das construções da cidade está no topo dessa montanha. Impressionante. E a ilha é também muito maior que eu imaginava. Gostei muito de Oia, o cartão postal de Santorine. Aqui estão as casinhas branquinhas e igrejinhas com teto azul redondo escorrendo pelo morro abaixo até achar o mar azul cobalto. O azul aqui é profundo, pois no fundo a rocha é escura. Essa ilha me encantou pela paisagem geológica. Lembrava da minha irmã Carol, geóloga a cada encosta. Praia vermelha, porque as rochas são dessa cor, logo depois paredão de mármore branco, navegando um pouco mais entre duas montanhas, um vulcão que entrou em erupção há uns 400 anos atrás e as pedras ainda estão soltas e a outra com rochas sedimentadas como ferro provando que a explosão tinha sido para lá de 3 mil anos. Carol, identifiquei alguns conglomerados e uns afloramentos, acho. Mas certamente faltou a sua legenda. Esse passeio teria sido mais interessante com você de guia especializada, como foi quando fomos juntas para Fernando de Noronha.

Mikonos, Grécia



Contudo, Santorine não tem praias muito agradáveis para aproveitar o verão. Mikonos nesse aspecto é bem melhor. É certo que cada ilha tem sua beleza. E foi maravilhoso estar em cada uma delas para ver essa diversidade. Mas banho de mar e largartichar na praia é para Paros e Mikonos. Este último ainda tem uma vida noturna muito animada. E um lugar para dançar até o sol nascer na beira do mar que vai ser algo para se lembrar para toda uma vida.
Ontem meus pais foram embora. E eu fiquei com a Rachel aqui em Paros. Amanhã seguimos para o último destino, Creta. Vamos ver o que nos espera nesta ilha Grega mais perto da África.
Um beijo no coração de vocês queridos que deixei, mas como todo ciclo se fecha em breve estarei abraçando vocês como na despedida.





Créditos: Fotos Rachel Joffily

Mais fotos abaixo para completar o albúm:

Mikonos, Grécia


Mãe e Pai

Irmã Rachel e Eu


Mikonos, deguste a beira mar
Ciesta, Mikonos
Mãe e Eu, Santorine

Lua cheia em Santorine. Abaixo por do sol no mesmo dia.
Santorine, Grécia

Saturday, July 9, 2011

Despedida da Itália


Despedida da Itália

fotógrafa Rachel Joffily
Natural e calma. É a sensação que tenho sentada no avião meio a duas figurinhas muito conhecidas, meu pai e Rachel, minha irmã mais nova. Acabou minha temporada sozinha. Foi tempo suficiente para estar comigo e suficiente para recebê-los com muita vontade de estar junto. Depois de quase dois meses na Itália me despeço dessas terras. Voamos rumo a Grécia saindo de Roma. Pela janela o litoral oeste Italiano acompanha todo o nosso trajeto.



Dias atrás estávamos dirigindo meio aos girasóis na Toscana. Campos inteiros amarelos e outros verdinhos com as flores ainda fechadas dizendo que o verão ainda estava iniciando. Castelos, cidades medievais eram a decoração da estrada.

fotógrafa Rachel Joffily
fotógrafa Rachel Joffily
Saímos de Florença e fomos à Lucca. Queríamos verificar a rua e ou a praça com o sobrenome da na origem italiana: Giovanini. Chegando lá a moça Italiana de Lucca diz que não tem rua, ou praça com esse nome. Chegou a colocar no Google map para conferir. Meio sem graça eu disse que deixasse pra lá. Saímos na cidade à procura. O mais próximo que achamos foi a Piazza San Giovanni. Mas santo já era demais. Meu pai tirou uma foto lá para marcar o território. Acho que era isso. Era tão importante pra nós estarmos “de voltar” às origens que acreditamos, ou criamos essa lenda. Uma praça com nosso nome.

Ainda na dúvida ligamos para tia Con, que esteve lá, não atendeu. Para tia Sara, que também foi em Lucca, recado. E finalmente para vovó Sonia a neta do Giovanini, que disse: “Isso é lenda. Vovô saiu daí com 14 anos não deve ter tido importância nenhuma”. Disse que a avó sim gostava de tomar banhos nas Montecalcini Terme quando ia à Itália. Bem, no dia anterior, querendo um caminho por estradas mais panorâmicas, tínhamos passado por essa cidade.

Pisa

 Lucca uma graça. Aproveitamos os restaurantes e os aperitivos. Fomos a Pisa aonde o monumental conjunto do Duomo, o Batistério, o Campanário e a Torre em um amplo espaço gramado formam uma fotografia grandiosa. O mármore branco com detalhes em granito verde e rosa e os mosaicos colorem essa paisagem que brilha ao sol de 34 graus.

Mas lindo mesmo foi descer de carro em direção a San Giminiano, a cidade de 72 torres. Que hoje sobraram 15, mas mesmo assim faz dessa cidade medieval preservada uma parada encantadora. Volterra estava perto então fomos lá verificar a cidade que supostamente foi filmado o Crepúsculo. Rachel que tinha visto as imagens disse que a cidade era linda. E é mesmo só que o filme não foi filmado ali. Mas em uma cidade próxima toda murada. Não tínhamos mais tempo para a caça aos vampiros então seguimos. Descemos pelos lindos campos de girasóis em direção a Montalcino. A idéia era achar um hotel no campo para dormirmos. Já tinha visto que nessa região de Chianci o agriturismo era bem explorado. Vale à pena. E ficamos no primeiro que paramos. Mais girasóis, subindo, subindo uma estradinha encontramos uma casa de campo antiga cheia de hortênsias, uma grande piscina e uma vista morro abaixo verde e amarela, alternando as flores com os frutos da região.

Final de um dia de carro nada melhor que um banho de piscina e um jantar completo. Completo na Itália significa: entrada, primeiro prato – pasta, segundo prato – carne, sobremesa, tudo regado a vinho e no final grapa. Para o meu pai, porque precisa ter caixa grande para encarar. Gostoso foi a chuvinha que refrescou mas depois do jantas sem pingos fomos para um pergolado estender a conversa e terminar a garrafa de vinho, produzida na casa. Recolhemo-nos depois desse fim de dia de passeio pela toscana em nosso apartamento enorme. Nome do quarto: Girasol. Meu pai deu uma sacaneadinha, dizendo que era muita sincronicidade! Porque eu passei o dia dizendo, “olha que lindo”, “olha”, e de novo, “olha”, “para pra tirar foto! Vem Rachel, no meio do campo de girasóis!”. Rachel com sua máquina bem melhor que a minha agora é minha “personal” fotógrafa. Estou deitando e rolando com isso, poso para cá e para lá. A minha máquina fica guardada depois da sua chegada. Sem contar que com seu olho e gosto pela fotografia faz desses tesouros de viagem ainda mais preciosos. Obrigada irmã. Mas não estou explorando já combinamos com cachê na volta.


Acordamos no campo toscano com trovões. Reclamando do calor e advertindo esses meus companheiros de viagem antes de sua chegada, a Toscana foi misericordiosa com eles, pelo menos nos primeiros dias. O campo aqui é para turistas então acorda é devagar. Só nós três de pé esperando o rapaz do café chegar para abrir o salão. 5 minutos depois do horário chega ele correndo, mas em outros 5 minutos o café está ali deliciosamente servido. Cappuccino feio um a um, mortadela cortadinha na hora, pães, bolos, geléias caseiras. E uma maça verde, durinha e azedinha que dessas só tem aqui mesmo.
Seguimos para Montalcino. Região de Brunello. O vinho parece mais elaborado que o Chianci, mais antigo. E achei mais gostoso depois da degustação precoce – antes do meio dia. Um lindo castelo medieval, uma cidade nada turística, ainda acordando, boa para passear. Paramos num boteco para tomar um café, que redeu presunto cru, com pão toscano, azeite extra virgem. Pleonasmo na região. Toda azeite que nos apresentam aqui é extra virgem. Não resisto e peço uma taça das que dançam a minha frente me seduzindo. E melhor, pedindo uma taça chegam duas para degustar, cada uma com o nome do vinho e o ano anotados na base. Uma delícia. Foi ótimo que com essa prova sabíamos como comprar as garrafas para tomar com a mamãe em nosso futuro encontro, na Grécia.

Carregamos na mala agora duas garrafas de Brunello de Montalcino compradas lá mesmo. Chique! E ontem em Roma aumentou o valor pois no restaurante esse vinho é caro. O nosso barato e com mais gosto pois foi buscado na fonte.

Roma nos recebe com uma degustação de vinho branco, embutidos, queijo e “crostine” para preparar nosso corpo e espírito para a primeira visita, Fontana de Trevi. Que fecharia nossa visita a Roma e a Itália, porém iluminada a noite.

Eu não esperava muito de Roma. Como já falei sou provinciana. Pessoa que não gosta de Nova York, São Paulo, prefere as vilas às megalópoles. Contudo, os monumentos imensos e a arquitetura belíssima de Roma com sua dezenas de praças têm o seu charme. Mas o encanto foi passear pela Roma antiga com uma guia romana que fala brasileiro, não é português, pois aprendeu na embaixada brasileira. O Coliseu é um espetáculo a parte. E as ruínas da Roma antiga tem outra gravação em nosso cérebro quando absorvida acoplada com uma riqueza de detalhes trazidos por nossa guia. 

Estávamos frente à duas colunas mas sabíamos que ali era a casa e o tempo das sacerdotisas Vestais. Elas mantinham o fogo da família eternamente acessos, que também era o fogo do governo. Nesse encontro de uma pessoa cheia de informações e cultura e nós três sedentos de significados para aqueles blocos que pisavamos montamos uma história cheia de palavras e imagens. Minhas imagens tinham até faces e movimentos dessas figuras, que me encantaram, mulheres designadas a manter o fogo centro da família acesso. O fogo que aquece e que alimenta. O movimento e a beleza dessas mulheres passeavam em minha mente. Elas tinham um poder ímpar para o gênero. Mulheres que decidiam até a liberdade de um condenado se assim fosse o seu desejo. Se assim foram ou não eu não sei, mas os seus vestidos brancos voavam em meus pensamentos emocionando meu coração. E a deusa Venus estava ali representada em vários pontos daquelas ruínas, sobraram só as colunas e sua presença. Caminhar por ali o centro de um império masculino mas com um ar de feminilidade e beleza que são virtudes daquela que os guardava.

Deixamos a Itália e damos um tempo para integrar todas essas experiências banhados pelo mar Egeu. E será nas Ilhas Gregas que fecharei os últimos dos meus 100 dias sabáticos. Agora já sinto a proximidade da volta. E tenho essa estranha e ao mesmo tempo conhecida percepção da relatividade do tempo. Inexorável.


Para passear pela Itália:
Acesse galeria de fotos feitas pela Rachel Joffiy

http://flic.kr/s/aHsjvx1gxJ

E mais algumas pra vocês:

San Giminiano
Pra vocês! Flores com saudades!



Florença
Fotógrafa Rachel - Casamento em Vinci

Pausa para o Café - sempre!







Wednesday, June 29, 2011

Ondas na Toscana


Ondas na Toscana

O ser humano não é um universo, mas um mar. E eu uma boa representante desse oceano. Ondas vêm e vão. Às vezes tem maremoto, mas não nessa temporada. O final de 2010 e o início de 2011 tiveram vários abalos sísmicos nas placas externas e internas, de mim mesma. E isso provoca terremotos e tsunamis. Às vezes um tremor na placa externa desencadeia uma seqüência de movimentos internos. Por vezes, algumas destruições. Mas como toda catástrofe natural, está aí para provar que o ser humano tem uma capacidade de sobrevivência inata. É certo que a custo de muitas perdas. E quanto maior a onda maior a devastação. Mas são nesses momentos aonde podemos ver a força criativa e sagrada daquele que sobrevive a catástrofe.
Mas como ia dizendo o tsunami já passou. E ele arrastou muita coisa para o fundo do mar, também revolveu a terra e deixou lugares vazios onde antes se erguiam algumas estruturas. E os lugares vazios geram possibilidades. Espaços... criativos... Espaços... para respirar... hummm...

Mas o que importa é aprender a tolerar.

Tolerar as ondas grandes porque sabemos que contra o mar ninguém pode lutar. Só surfar ao boiar. Porque ele tem sua força e vontade própria. Incontrolável. Mas nosso corpo conta com a capacidade de flutuar, mergulhar, bater o pé no fundo e conseguir voltar para respirar. E esperar que a seqüência de ondas grandes passe para então escolher o melhor momento de sair para descansar na praia.

As ondas estão menores nos últimos meses. Tem sido necessário pouco esforço para estar no mar. Ou talvez tivesse estado mais na praia. Mas ninguém agüenta ficar na praia o tempo todo sem entrar na água. Então deve ser assim que o nosso corpo funciona, muito tempo ao sol, vamos dar um mergulhinho, pular umas ondas. Ou talvez seja uma imagem inversa: o corpo largado na areia achando que o descanso é eterno quando uma onda vem, pois a maré sobe, e molha tudo sem nem esperar. As vezes não dá tempo nem de catar as coisas.

E o que fazer quando a maré sobe? Pode-se xingar, se desesperar, se destemperar... Mas eu tenho aprendido, ou pelo menos exercitado, tolerar. Venha a onda que vier e eu fico ali boiando e esperando a hora que o mar vai acalmar. E o melhor e que quando consigo sair à praia o prazer tem sido também mais gostoso. Talvez porque aprender a tolerar as ondas de sofrimento, faz com tenha mais tolerância para as ondas de prazer.
Um outro desafio é tolerar o marasmo. Esse momento de ócio, ou até tédio, do nada. Aonde o muito não acontece. Há isso sim é o exercício. Porque saber ficar no nada é o grande antídoto da ansiedade. Estou no exercício. E olha que estou podendo estar.

Assim, por alguma razão o prazer não tem sido mais uma euforia, mas uma leve brisa suave sobre os pelos da pele quente. Sutil.

O interessante é observar. Como lhes falei o meu “grilo falante” tem estado atento, mas também não tem o que fazer. Não está trabalhando, namorando, sem compromisso nenhum, então sobra toda a atenção dele pra mim mesmo.

Dias atrás quando estava em Montelupo Fiorentino, terra da cerâmica toscana, fui invadida por muitas ondas. Um dia estava montada em uma bicicleta e um mapa na mão. Tinha a intenção de um destino, mas superei todos os meus limites. Fui por um caminho e voltei por outro, passei por várias cidades, subi e desci moro. Pedalei meio a plantação de trigo, de uva, visitei Vinci, a cidade de Leonardo. E lá vi seus inventos. Mas o bom mesmo era estar largada nos pedais. Sozinha. Meu senso de orientação neste dia estava aguçado. Raro! Pouco olhei no mapa e sabia aonde ir. Das 10 da manhã as 5 da tarde minha bunda ficou apoiada naquele banco. Todos que já pedalaram depois muito tempo parado sabem o resultado. Ai! Mas não sentia dor só o prazer do movimento das minhas pernas, do vento no rosto, e dos banhos nas bicas das cidades debaixo de 35 graus do verão na Toscana.

Pensava. Liberdade é:
- Poder escolher viajar.
- Liberdade é deixar de conhecer um ou outro ponto turístico simplesmente porque meu corpo não quer aquilo naquele momento.
- Liberdade é num dia chuvoso, pegar um trem e ir almoçar em Verona.
- Liberdade é gostar muito de um lugar e poder ficar ali até esgotar a vontade.
- Deixar roupas pelo caminho para carregar uma mala mais leve.
- Liberdade é movimentar a barra da saia pelas ruas sem destino.

Liberdade é...
 
Vocês lembram do “Amar é... “?

Então pedalava e pensava isso. E meus pensamentos concluíram: liberdade mesmo é estar montada em uma bicicleta, e, conduzida pela força e pelo movimento do meu corpo me levar para onde eu quiser ir.

Resgatei aqui a sensação dos 15, 16 anos, quando ainda não dirigia. Mas aquela bicicleta me levava para todos os lugares não importava a distancia. 



Visitava minhas amigas, ia tomar sorvete na Shakes,  para aula de teatro no Ceub, para o iate clube e os incontáveis churrascos dessa animada adolescência sob catracas.

Essa foi uma onda gostosa que me invadiu.



No dia seguinte a sensação de liberdade continuou ao pegar um trem para uma cidade vizinha e caminhar uns 15 minutos com indicações para repetir a aula de culinária. Mas liberdade eu pude sentir ao conhecer minha amiga da Arábia saudita. Como diz ela, meia da Arábia Saudita meia do Líbano. Seu êxtase em estar na Itália, viajando sozinha, alugou um carro e foi de Florença par aula de culinária dirigindo, era contagiante. Beber vinho, fumar, dirigir, amarrar uma blusa no meio da barriga eram extremos prazeres libertos para uma mulher que vive em um país aonde a população e mais ainda as mulheres vivem debaixo de leis muito rígidas. Prazeres que para nós faz parte do dia a dia para eles é crime. Vinho é tão proibido como cocaína disse ela.

Identificamos-nos desde os primeiro contato. Fizemos uma farra na aula de culinária. Continuamos as taças de Processo no hotel em que ela estava hospedada meio aos campos. E depois fomos de carro para Montelupo. As gargalhadas nos seguiram. Ela ria das perguntas curiosas que eu fazia e eu das respostas que ela dava. Uma intimidade instantânea de dois mundos femininos tão distintos e tão próximos.
Sua alegria e gozo pela liberdade me contagiaram ou complementaram o que eu tinha sentido no dia anterior.


Contudo, emoções agradáveis e intensas também podem provocar abalos sísmicos. E foi assim que meu grilo interpretou a onda que veio a seguir. Por alguns dias eu fiquei super introspectiva. Em alguns momentos me senti muito só. Em outros uma sensação de estar perdida. Muita saudade de casa e dos amigos que já estavam a distancia por 2 meses. Uma tristeza profunda em outros tantos momentos. Parecia que tinha cansado de viajar, de estar longe. Mas ao mesmo tempo não era tão só isso. Eram novas ondas altas.

E o que fiz? Fiquei boiando.

Boiando. Apesar das sensações desagradáveis e do sofrimento não fugi. Fiquei ainda mais em contato comigo, com meu corpo. E ouvi muito o que ele queria a cada dia. Se queria ficar em casa lendo eu ficava. Se queria dormir durante toda a tarde eu dormia. Se não queria comer fora, pois naqueles dias ser a única sozinha numa mesa de restaurante era uma sensação ruim, eu comprava comida na padaria e comia na salinha do meu delicioso Bed & Breakfast. E assim fui me respeitando. Meio a tudo isso a vontade de movimento também estava presente. Então quando o dia refrescava saia para correr no parque ou na beira do rio.
E foi numa dessas corridas ao por do sol, pra lá das 8 da noite, que tive um prazer intenso, imagens da cirurgia pipocaram em minha mente, no momento em que eu senti uma grande quantidade de ar no meu nariz. Um choro e uma alegria me invadiram. E de repente em contato com a sensação de morte daquela anestesia também estava em contato com a melhor sensação - a de estar viva. Respirando!

E o ar movia por dentro das minhas narinas e eu sentia o seio da minha face. Enquanto minhas pernas corriam muito fortes e rápidas. Lembro da luz do sol e do calor no meu rosto. Sabe é isso. Eu sei viver. Tenho um prazer em estar viva, é o que basta.

O mais como diz Tolle, Vida é isso que permanece, isso que somos. O resto é situação de vida. Se isso está bom, aquilo está ruim. Não é a vida que está boa ou ruim. A vida não muda. O que muda são as situações momentâneas.


Essa leitura me acompanhou na recuperação da cirurgia. Esse exercício de ficar ligada no presente, O Poder do Agora, foi um exercício e tanto meio a tanto desconforto físico, emocional e espiritual daquele momento. Mas fiquei ali. E dizia pra mim mesma: “agora eu quero ver ficar ligada no presente com o nariz tapado de sangue, a cara inchada, dor na cabeça, tontura... sem ficar ansiosa para que tudo passe e que acabe logo. Só posso lhes dizer agora que isso foi algo muito bom de fazer.

Bom também foi conversar com Matheus depois dessas ondas. Fui ainda ressaqueada, para Verona assistir a ópera na arena romana. E durante o aperitivo dividi a vivencia das ondas dos últimos dias. E ele me falou algo muito parecido com isso, que ele tentava achar algo que não mudava, que sempre estava ali, algo que era ele. E que independente de a situação estar boa ou ruim ele se lembrava que tinha aquele ponto. (Matheus se não for dessa forma pode publicar suas palavras nos comentários. Vou adorar.)

Então mais uma seqüência de ondas passou sobre mim durante esses dias. E hoje depois de uma manhã de corrida no parque, sentindo novamente todo o ar dentro de mim, a força das minhas pernas, um banho gelado, sentei debaixo de um ombrelone, na mesa da calçada de um restaurante ao lado do meu hotel, e com o corpo quente e fresco ao mesmo tempo, senti um arrepio por todo o corpo quando o vento que vinha por traz tocou minha pele. É isso aí, a sensação da minha pele com o vento. O vento com a minha pele. Era a mais linda constatação de que eu estou viva. E como as ondas estavam baixas. Eu estava confortavelmente sentada sozinha em um restaurante pedindo o que eu queria comer e beber. E degustei cada pedacinho do que escolhi para comer e cada gota do que escolhi para beber. 

Quando o garçom chegou com a taça de Processo, que tinha pedido, olhei com uma cara de criança quando ganha aquela boneca tão desejada. Abri o sorriso. Ele aparece segurando na mão uma taça grande, morango decorando ao lado e dentro, um charme, um espetinho de frutas vermelhas, blue Berry, framboesa e morango. E assim voltei a estar na praia, sentindo o gosto de fruta por fruta meio aos goles da bebida de grandes comemorações. Ou das simples comemorações...

Como se não bastasse, meus olhinhos reviravam, quando as garfadas de ovos estralados com fatias de Trufas (em letra maiúscula de propósito), fartamente distribuídas no topo, chegavam a minha boca. Óleo de trufa já era um dos meus sabores preferidos. Mas comer as lascas foi realmente o auge do deleite.

Eu e Padrya no dia das mulheres: salão e espumante.
E assim sigo em Florença pela segunda vez, agora hospedada no centro, mas longe o bastante para não estar no burburinho dos turistas de um dia. Aproveito a corrida no parque, a ciesta pela tarde quente, pois minha casa agora está perto de tudo. E depois muito descansada saio novamente a rua depois das 7, quando o sol já acalmou, para arrastar a barra da saia pelas ruas, a caminho de um espetáculo de dança, As 4 estações. E no caminho, na praça, vejo o ensaio de outro espetáculo que terá amanhã de graça no meio da Praça das Senhorias. E volto para “casa” depois de um delicioso jantar comigo mesma inspirada para escrever. Liberdade é... escrever até quase 3 da manhã só porque deu vontade.

Ps: Acabo de pegar o email da minha mãe dizendo que meu pai e a Rachel já embarcaram. Dia 1 de julho farei a recepção deles nessa cidade que agora cabe na palma da minha mão.

Beijo no coração.
Em especial pra os anjos que sintonicamente apareceram nos dias de ondas altas.
Lívia, que depois de sua meditando mandou para o meu celular uma linda foto de um buganvile com uma mensagem oferecendo “toda essa energia pra você minha amiga”.

Moisés que mandou um email falando da oportunidade dessa viagem só para abrir espaço para intuição e outras lindas palavras de apoio.


E minha mãe que mandou uma imagem muito simbólica desse momento com uma linda mensagem. A imagem representa o inverno. Eu estou vivendo o solstício invertido aqui. Mas o momento que a semente se rompe para começam a aparecer as flores, aqui no clima temperado, é na primavera e no verão.
Dri mamãe disse que essa imagem é para complementar a anterior que você me mandou do renascimento. Veja.

E com essa força das estações e das pessoas que me acompanham vou rompendo também a semente e renascendo mais uma vez. Pois nessa vida há que se morrer e que se nascer diversas vezes, para ressurgirmos com mais vigor.
Assinado A Flor.

Flor de Alcachofra: Bed & Breakfast Montelupo


Tuesday, June 21, 2011

Para comer pelas beiradas

Para comer pelas beiradas

Gelato Fruto di bosco, meu preferido aqui! Siena
Florença é igual sopa quente. Tem que começar a comer pelas beiradas senão queima a língua. E assim o faço. Passo pela estação de Florença e logo pego o trem para Ligúria e lá passo 10 dias na costa das 5 Terre. Muitas voltas e quando estou perto de ir para Florença, de novo, passo pela estação e pego o ônibus para Siena. Até então o que conhecia de Florença era a estação ferroviária e rodoviária.




Siena um lugar mágico. E muito bem preparado para o turismo. Tenho dias lúdicos nessa cidade murada no alto de um morro, no meio da Região de Chianti. Para o dia seguinte agendo um tour de degustação de vinhos, com direito a parada em vilas com castelos. Na primeira vinícola tenho um brinde a parte, pois está tendo uma exposição de um ceramista da toscana. Fico encantada com as peças e não sei se presto atenção no vinho ao nas obras de arte. De qualquer forma o lugar ficou ainda mais lindo, com os tonéis de carvalho enormes de vinho meio a esculturas de cerâmica.

Um casal que eu tinha conhecido no “boteco” no dia anterior estava no tour e foi gostoso encontrá-los lá. Americanos. São sempre os americanos que puxam conversa, chamam para jantar. Nesse dia estava um calor, então no fim de tarde acho um boteco aonde peço um chop e vou para sacada que tem vista para a linda praça. Aonde acontece o Palio de Siena. Ela pede para eu tirar foto e começamos a conversar. Boa desculpa para interagir. Logo depois ela me convida para jantar com eles. Aceito.

 E descobrimos que estávamos com a mesma dica de restaurante, dos nossos guias, que foi uma delícia. Pici, massa caseira, ao molho de carne de pato. Outra coincidência que no dia seguinte iríamos para o mesmo tour. Assim tinha amigos para um dia todo!
No segundo dia agendo uma aula de culinária. Estava igual criança excitada com a brincadeira. Era uma turma pequena, eu, uma mulher sozinha do Havaí e um casal, também americanos. Tudo uma delícia. Comendo e bebendo por horas. O azeite extra virgem da região o vinho Chianti Classico, que agora sabia o que era pelas explicações do dia anterior.

Outra atração local é a catedral de Siena. Algo para se fazer antes de morrer. Aliás, adoro aquele guia 1000 coisas para fazer antes de morrer. Já tinha comentado com a Carol, minha irmã, para fazermos o nosso site, 1000 coisas para fazer antes de morrer pelas irmãs Joffily. Porque Carol até então era minha irmã companheira de viagem. Rachel, a outra irmã, inaugurou esse hall no último verão no sul do Brasil e no mês que vem vai ser incluída na “trupe” irmãs viajantes para além dos limites do Brasil. Neste momento, dia 21 de junho, já estou viajando com vontade de encontrá-la dia 1 de julho junto com meu pai, em Florença. E juntos vamos encontrar minha mãe na Grécia dia 8. Nesse momento da viagem já tenho muitos compromisso, datas agendadas (risos). Aguardem o “Grand Final” dessa jornada de 100 dias que se dará nos palcos das ilhas Gregas. Só vai faltar uma atriz importantíssima, parte desse contexto, que está impossibilitada de viajar. Mas vou levá-la no meu coração, Carol.

Voltando. Deixo Siena com gosto de quero mais. Mas vou para Florença, pois já tinha marcado com a Padrya, prima do Rodrigo, meu primo, aonde ficaria hospedada por 10 dias.

Passo pela estação Santa Maria Novela novamente e sem ver a cidade pego um taxi para casa dela. Na beirada de Florença. Almoçamos em casa. Isso era quinta feira e acabo tendo um final de semana super caseiro com direito a arroz, feijão e farofa. Que é o que precisava. Uns dias de casa para descansar do turismo. Então pauso na beirada de Florença. Sinto que preciso me preparar para conhecê-la. A tão falada Florença. Então aproveito a pausa para me informar sobre a história e os pontos principais.

E assim vou experimentado Florença da borda para o centro. Na sexta vou à tarde só respirar a cidade. Não quero ver nenhum ponto turístico a não ser o que passar pela minha vista no meio da rua. Como aconteceu. Estou caminhando vindo da estação, finalmente, ao centro da cidade histórica e dou de cara com o Duomo, a Basília Nossa Senhora de Fiore, grande impacto! O queixo cai. E preciso ficar ali por um tempo, meio a multidão de pessoas, olhando pra cima, tentado apreciar cada detalhe dos entalhes externos daquele monumento.

Esse é o retrato do turista: parado em pé, cabeça pra cima, olhando. Vi uma curiosa representação na vitrine de uma loja. Vários bonequinhos de cerâmica, cada um de uma cor, em fila, todos olhando pra cima. Título: Turistas. Quis tirar uma foto, mas como outro dia tomei uma bronca por fotografar obras de cerâmica. Não ouso dessa vez. Mas quando passar por lá de novo vou tentar só para sanar a curiosidade de vocês. O artista foi muito perspicaz.


Quero um happy hour. É sexta, não é minha gente?! Quer programa melhor? Dia de primavera, quase verão, o sol brilha amarelo no céu azul anil da Toscana, até quase 10 da noite, nada mais propício. Então acho um lugar de aperitivo na praça das Senhorias. Estou em frente ao Palácio Vechio, com a cópia do Davi de Michelangelo à frente. E peço um Beline, que já estou querendo provar a dias. Tudo tem sua hora certa. O drink demora. O garçom diz que o pêssego tinha acabado e que eles tinham ido buscar mais. E quando chega. Esse era o Beline que deveria ser o primeiro da minha vida. Em uma taça daquelas antigas de champanhe, taça baixa, bochuda. Igual a do casamento dos meus pais. Esse Beline era Champanhe batido com pêssego fresco, que está na época. Então delicio esse delicioso o drink feminino primaveril! A tarde está linda e sigo com um processo.

Também é hora de aperitivo. Já lhes falei o que é aperitivo aqui na Itália? É assim, entre 18h e 20h em alguns bares você pede a bebida e come petiscos à vontade. Nesse lugar eles traziam pequenas porções na mesa. Em outros, você serve do Buffet. Agora já conheço vários. Os mais granfinos a bebida é mais cara, mas em compensação a comida tem qualidade, dispensa o jantar. Se quiser beber mais que comer vá para os mais populares.

Estava pensando em jantar depois, quando, batendo perna para fazer hora chego a uma praça miudinha, Santo Ambrósio, lotada de gente bebendo em pé, sentada nas escadas, todas com taças de vidro, a maioria de prosseco ou vinho branco. Uma visão inusitada. Taças de cristal passeando pela praça. Adoro! Então perco as horas e a fome com mais prossecos e petiscos nesse lugar. Pena, que parece um lugar local, e o povo da cidade mesmo interage pouco. Então não encontro nem homem, nem mulher para jogar conversa fora. E olha que eu usei a estratégia do balcão, hein irmã?! Mas adorei de qualquer forma estar “no lugar” de happy hour de Florença.

Padrya diz que eu não pareço estrangeira, então não chamo a atenção. Senão as pessoas viriam falar comigo. Vou com ela na escola de sua filha, Nayla e ninguém desconfia que não seja da terra.
Florença vai aquecendo dia a dia. A sopa quente ao invés de esfriar esquenta. Depois de uns dias passeando “no meio do prato”. Estou derretendo.



Então vou para uma outra aula de culinária, fora da cidade, em uma Vila. Vila aqui é uma propriedade, como um casarão, uma fazenda. Essa era Vila Pandolfini. Uma construção que servia de fortaleza para vigiar a entrada do rio para a cidade, do século XIII. A cozinha um espetáculo. Nesse grupo éramos 15 pessoas. E foi outro dia encantador meio a panelas, massa fresca, azeite de oliva e vinho. Tudo feito naquela propriedade. Fabrica até bicicleta. Arrisquei-me a tentar programar o tour que fazem de bicicleta lá, pelas cidades da Toscana. Mas achei muito profissional, horas pedalando morro a cima e abaixo. O grupo vai passar 7 dias montados na bicicleta. Eu poderia acompanhar 1 dia, Mas vejo o percurso e acho que vou ser uma mala sem alça pra eles. Então fico apenas com a culinária que vou repetir dias depois.


Nesta aula fiz massa fresca de novo. O primeiro prato aqui é sempre “pasta”. Fizemos um ravióli de espinafre com ricota ao molho de manteiga com sálvia. Hummm! A ricota aqui não se compara com a nossa, parece um creme, suave, macia. Estou ficando craque em massa. Separa a máquina de macarrão aí vó!!! Vou precisar quando voltar. E aproveita e veja a foto que tirei pra senhora. Coloquei um bilhete ao lado: “Para vovó Sônia”. Essa é minha homenagem pra você vó. Claro que sua neta derretida quase chora quando estava pousando para a foto. Sua neta fazendo massa, coisa que você era craque, aqui na sua terra, toscana. Nossa terra! De vez enquando perguntam: “Mas você tem origem italiana?” E não é por causa do nariz. Digo toda prosa: “Sim de Lucca! Giovanini!” E o comentário é unânime. Giovanini é um nome muito toscano.
Os últimos dias foram todos pelas beiradas pois Florença está fervendo. A cidade foi feita a beira do rio Arno, mas isso fica em um Vale com pouca ventilação, somado a quantidade de turistas no local faz com que o miolo seja a parte baixa da Divina Comédia.

"a cara da riqueza! diz a Padrya."
Para refrescar, sábado, uma praia às 1h de Florença com vento a mil por hora. Valeu o banho de mar. Domingo em Arrezo. Fomos ver uma festa medieval. Quando chegamos descobrimos que tinha sido no dia anterior. Davide, marido da Padrya ficou super frustrado. Mas fizemos nossa festa em uma mesa no meio da praça com massa e vinho. E depois uma farra na arena romana do século I e II. Interrompido por uma bronca de uma matrona italiana. Fomos descansar do almoço na grama dessas ruínas. Padrya empolgou me fotografando, e fizemos um book. Aproveitamos o espaço para brincando com Nayla, jogamos capoeira com rasteira. Ela adorou. Fizemos estrelinha. Mas quando essa mulher, lá de cima do convento, que agora é um museu, viu que a gente e outras pessoas estavam sentadas, deitas e com as bolsas em cima das pedras ela grita lá de cima em italiano. Qualquer coisa em italiano já parece uma bronca, imagina com motivo. Mas Padrya que é agora uma “italiana nordestina” não deixa por menos. E retruca dizendo que não tinha nenhuma placa e que a mulher devia pedir com educação. Um episódio turístico a parte. Essas discussões dos italianos fazem da comunicação diária e do meu turismo.




Segunda acordo com a alegria de ir para Montelupo Fiorentino para o meu curso de cerâmica. Algo que espero desde que saí do Brasil. E na seqüência com a frustração de receber uma ligação dizendo que o curso tinha sido cancelado por falta de quorum.

Um choque, pegaria o trem em poucas horas. Aquele baque inicial. Uma tristeza. Deu até vontade de chorar. É impressionante o que o nosso cérebro faz com a gente. Por um momento tenho um sentimento exagerado em relação a esse ocorrido. Tudo bem que era das atividades por aqui o que eu mais queria. Foi como tirar um pirulito aqui da boca da criança. Mas aquela tristeza. Desproporcional.

Acho que agora tenho um “observador interno” mais acordado, meu grilo falante, e fico ali parada em casa, com um diálogo com ele, comigo mesma: “Lydia foi só o curso. Você ainda pode ir para festa. A vida é assim imprevisível. Condição inerente a estar viva. Não sabemos o que vai acontecer de ruim ou de bom.” Os pensamentos parecem ter vontade própria. Tentando acalentar o meu coração.

Mas é que essas frutraçõeszinhas diárias detonam o arquivo de frustrações da vida. Principalmente as não resolvidas ou recentes. E o diálogo continua sem que eu controle: “Lydia você está na Toscana!” As vezes isso parece um sino que me desperta. Os pensamentos continuam no trem a caminho de Montelupo. Quando eu consigo separar o acontecimento do dia do pacote empoeirado.

E aqui estou eu em Montelupo Fiorentido, a cidade da cerâmica, meio a “Festa della Cerâmica”. A festa só acontece depois das 19h porque aqui é “píu Caldo”, quente demais para alguém sair no meio do dia. A população fica entocada durante o dia e saí quando o sol refresca.

Chego em um Bed & Breakfast gracinha. Uma apartamento de 2 andares na rua da festa. Embaixo mora Ana, Francesca e Teresa, suas duas filhas. E no andar de cima, no sótão, ela fez a hospedagem, recém reformada. Dois quartos apenas, com uma salinha e uma cozinhazinha aonde serve o café da manhã. Acho lindo e romântico. Estou aqui, no telhado escrevendo pra vocês. Nessa parte de cima os cômodos são triangulares porque pega os dois lados do telhado, com aquelas janelas de vidro que abrem, deixando a luz e ar entrar, mostrando o céu. O meu quarto poderia se meu. Todo branquinho, com detalhes em lilás e verde. Minhas cores preferidas, flores na janela ao lado da cama. Travesseiros, almofadas e edredom fofinho. Até um futón no chão para meditar. Sinto-me super confortável. E a pessoa do outro quarto está a trabalho então chega para dormir e saí cedo. Resultado, tenho um apartamento todo pra mim. Tinha planejado acordar cedo e sair de bicicleta. Que a dona super solícita me emprestou, mas acordo as 10 e meia, fico tomando o meu café, nesse telhado, com sol batendo por horas. Depois venho resolver alguns programas para os próximos dias na Internet e escrever. As horas passam e o dia esquenta. Se sair agora às 3 da tarde serei a única na rua, como ontem, a cidade é fantasma na hora da “ciesta”, tudo fechado.
Desfruto o dia em casa, casa lindinha, para fazer nada. Super necessário meio a tantos dias viajando. E também estou aqui para pausar... Sinto-me muito confortável em estar em uma cidade “picola” sem muito pra fazer, mas com tempo e espaço para as minhas coisa. Correr, ler, pedalar, escrever, meditar, dormir, comer. Simples mas tudo...

Ontem fui correr em um lindo parque a beira do rio e de um hospício, uma construção enorme e antiga. Depois jantei o meu preferido, massa com molho ao fungui trufado. E fiquei horas vendo a demonstração nos estandes, no meio da rua, dos ceramistas. Bati papo com eles e tudo.

Parece que cheguei à casa de uma tia. Ontem quando, no meio do dia quente e vazio, volto pra “casa” encontro Ana, a dona, pergunto sobre curso de culinária aqui, mas ela acha que não tem. Logo me diz que ela adora cozinhar, que fez curso e pães e doces (em outras cidades). Larga a vassoura e me chama para a cozinha, aonde nos sentamos e batemos papo por uma boa hora comendo a torta de ameixa fresca e o pão que ela mesmo fez. Pergunta o que eu quero para o café da manhã do dia seguinte. Muito receptiva. Ela foi por conta própria à escola de cerâmica ver o que tinha acontecido para cancelarem o curso. Ficou toda preocupada comigo. Então se oferece para ir comigo na cidade me mostrar aonde teria as demonstrações e saber das visitas que estão acontecendo durante essa semana.


Ando com ela cumprimentando a cidade toda. E ela diz: “cidade pequena é assim a gente anda dizendo Ciau (Tchau, que é o Oi deles) para cada um que passa”. Descemos a rua e o moço a padaria oferece “fritura de pasta” que acaba de sair. Comemos. Ele está montando a mesa fora da loja para a festa. Tudo está para fora das lojas durante a noite na festa. E vamos à casa de uns amigos dela pegar a bicicleta que ela vai me emprestar para eu poder visitar cidades vizinhas como Vinci, de Leonardo, nos próximos dias.

Mas hoje aproveito o repouso na minha nova morada dessa semana. No fim do dia vou visitar uma fábrica de cerâmica, tem grupos organizados para o evento. E estou perto de Signa, cidade do último curso de culinária, então nos próximos dias devo repetir a dose.

Ainda comerei um pouco mais pelas beiradas para depois voltar pra o meio do prato quando a sopa vai estar, com certeza, ainda mais quente, nos primeiros dias do verão.
Deixo um abraço com gosto das coisas simples e prazerosas da vida.